a million parachutes

for us

30 novembro 2005

:: cinema

os semáforos escondem um cinema.
ela quer fazer narrativas de amor no atenção do amarelo.

28 novembro 2005

:: tsuru.45

longe é a distância entre as duas pontas dos nossos sorrisos.

27 novembro 2005

:: the flaming lips

ele veio do espaço numa bolha de plástico. convidou amigos de pelúcia para cantar junto. tocou as músicas que falavam sobre quando deixou de ser menino, de como sua namorada usa revistas para limpar o nariz ou sobre a confiança que tem em yoshimi certo de que será defendido contra os robôs do mal.

ele faz música com instrumentos que imitam vaquinhas e patinhos. e além de tudo isso, mesmo sendo de outro planeta, conhece o nosso pior pesadelo: o senhor bush.

quero que meus lábios estejam em chamas para que minhas palavras tenham força e eu possa também fazer sonhos palpitarem em acordes dissonantes.

24 novembro 2005

:: madeleine

quando madeleine começou a cantar, fui tomado por vibrações em todos os cantos do meu corpo. meu coração apertou-se como as crianças fazem desconfiadas de até onde podem apertar. meus pés acompanhavam o compasso da música e eu sabia algumas letras. era como se eu já tivesse visto o show muitas vezes, como se já conhecesse madeleine e pudesse lhe falar. alguns momentos eu voltava a mim e mergulhava na minha timidez. mas quando ela cantava, eu me tornava familiar a mim mesmo. como se uma felicidade torta e de última hora sentasse ao meu lado e segurasse a minha mão para também ela acompanhar o compasso.

quando fui embora, nem me despedi, absorto que estava. estava pensando se sou tão tolo de ter desistido da felicidade. porque é um auto-engano achar que ela não existe ou pelo menos não existe em forma de pulso. ou se o engano é para essas surpresas. embora ninguém tenha me acompanhado para vê-la e a solidão ter sido das mais obliquas, pude levar toda uma noite de blues e amores no meu corpo que ainda resiste e faz compasso.

20 novembro 2005

:: pergunta

alguém lê isso aqui?
:: tsuru.44

é uma ponte arqueada para que o longo caminho pareça pouco.
:: princesa saki

a princesa saki tinha a estranha mania de correr pelas plantações de seu reino. mas tudo que derrubava ou pisava trazia para casa depois de pagar uma quantia justa a quem cultivava. começou com a correria seis meses depois que o rei morreu. na cozinha, a princesa saki aprendeu as artes dos temperos e dos marinadas. a rainha dizia que ela herdará o bom gosto do rei.

aos 16 anos, os pés da princesa já tinham calejado, tornou-se a cozinheira chefe do seu castelo e deu-se a poesia depois que descobriu a biblioteca secreta de seu pai. aprendeu línguas e arriscou rimas. apaixonou-se por um plebeu, largou a nobreza e arranjou uma terra para plantar.

o seu marido não entendia a disposição em que ela fazia a plantação, cheia de curvas e descontinuidades. ela sorria com ternura para ele e apontava para o céu. nunca tiveram tempos ruins, as colheitas sempre foram generosas. ele achou que era alguma ciência. e ela teve tempo de lhe ensinar a ler e a marinar frangos.

aos 26, saki ficou tuberculosa. em seu último leito sussurrou a seu marido que dissesse a mãe que a amava. e a ele pediu que lesse os morangos da terra -- era tempo de morangos -- como se estivesse no céu. ele não entendeu. saki faleceu na manhã seguinte.

o marido de saki foi até a plantação e colheu alguns morangos tentando entender o que dizia a sua mulher. a rainha chegou sem alarde e disse que recebera o recado. ele disse que não havia mandado nenhum porque sempre teve esperanças de que a princesa sobrevivesse. a rainha pediu que o acompanhasse até o castelo.

subiram até o quarto de saki que ficava numa das torres mais altas. e de lá ele viu sua casa. e na plantação havia um poema nos folheados dos morangos que falava sobre amor e bibliotecas secretas.

15 novembro 2005

:: tsuru.42

eu ando na cidade solitária e ela tem muitos pés que se entrelaçam. às vezes sinto uma solidão que dilacera o meu peito de uma forma até gentil porque o amor é assim gentil aos que se dão a solidão dos pés.
:: robert johnson

robert johson amava as mulheres e isso lhe custou a vida.

aprendeu a tocar violão de um jeito torto, mas foi numa encruzilhada exata que sua guitarra lhe falou como conquistar as mulheres.

gravou 29 canções num quarto barato de hotel e ao contrário da encruzilhada, foi estes baquelites que o imortalizaram na história do blues. se ouvir essas gravações desconfiará que há duas pessoas nos violões.

foi assassinado por algum marido ciumento com veneno em sua bebida, mas sua alma já estava perdida no primeiro acorde que dedicou ao demônio.

14 novembro 2005

:: tsuru.41

eu quase podia pegar o ninho do passarim... o que pensava a mãe ao fazer o ninho tão próximo dos homens?
:: linguagem #01

a artéria que pulsa no meu braço conhece código-morse.
mas faz questão de usar a gramática dos braços.
se você acha que meu abraço está dizendo alguma coisa
traduza em código-morse de língua.

12 novembro 2005

:: não me fale de tremedeiras

o pior da tremedeira da mão é quando você acha que vai conseguir por pouco realizar uma coisa simples como encher um copo de cerveja.

11 novembro 2005

:: ouvir

por mais que eu fale para seu coração,
a seus ouvidos são dados o dom da captação
e à cabeça -- capsula de memória -- a seletiva.

08 novembro 2005

:: tsuru.39

o mar perdido no horizonte da tempestade ainda é mar.
:: half man

o que restou de nós dois foram os seus óculos de leitura sobre meu livro da virginia woolf.
:: fade away blues

a cada dia que passa, eu desapareço mais.

percebo que as minhas unhas já não crescem mais como antes. meus cabelos, ah, de que adianta tantos tratamentos se são levados pelo vento e os ventos também não voltam? perco o apetite, o peso, as melaninas e os potássios. quando tomo banho, sou ridículo de sentir tristeza pela sujeira que vai embora... essa tentativa de voltar a me tornar concreto.

vejo mais meu r.g. do que aos meus amigos. não me lembro do número de telefones deles. meu telefone quase não toca. não me lembro do meu número.

as minhas roupas não voltam mais da lavanderia. já desencanei das meias e só tenho um par de tênis. o estado já não me cobra mais contas. meu cpf está cancelado. ninguém quer me vender por mala-direta. mas eu ainda sei ouvir canções.

cada dia que passa, faço menos sentido. a cada hora, a falta se transforma em saudade. e a saudade vai deixando o espaço para outras coisas. e as outras coisas vão desaparecendo também. mas eu sei ouvir canções.



07 novembro 2005

:: são paulo

são paulo quer dar velocidade à garoa.
a garoa quer desacelerar são paulo.
:: bessie smith

bessie smith está cantarolando um blues em sincronia ao barulho de seu trem. evita forçar a voz rouca, porque esse ano o sul anda muito frio. olha a velocidade da paisagem que passa por seus olhos, acostumou-se a não fixar o olhar. tudo que vê são manchas horizontais e mutantes. sente-se segura. ninguém para lhe aborrecer a pele e os lábios.

pensa na praticidade do trem. ela mesma, tão alta e viril, é um trem. corria sem se preocupar com o que há no caminho porque sabe que havia homens que construiram com grande engenhosidade esses caminhos. a liberdade, pensa, deve ser vencer um trem.

bessie smith morreria alguns anos mais tarde, no hospital, esperando por socorro. atropelada por um carro... porque o trem, ela venceu.

06 novembro 2005

:: no ônibus

quando a mulher do banco da frente soltou os cabelos, veio-me um cheiro de morangos. como se guardasse frutas capilares.
:: michele

michele subiu ao palco com muita elegância. cabelos presos para expor sua nuca. sobrancelha desenhada a lápis. vestido de noite mas discreto. só a maleta que carregava era díspare. batom para disfarçar os lábios finos.

testou o microfone e disse algo ao baixista. deixou a maleta sobre o amplificador da guitarra e abriu.

tirou de lá uma gaita das muitas que havia. fez contagem e começou um blues daqueles dançantes. era tomada pela alegria enquanto tocava.

durante as músicas, ajeitava o batom com um espelho que também estava na maleta. mas o formato da gaita desenhava um sorriso tão bonito na boca que só michele conseguia trazer o blues de volta a platéia enquanto tocava.

05 novembro 2005

:: mais tsurus

a chris guardou todos os tsurus num lugar... vai lá ver.


:: tsuru.38

se um tsuru cagar na sua cabeça,
retruque outro verso!
:: tsuru.37

"sonhar desperta. "

04 novembro 2005

:: eu quero ser cronópio!

"O canto dos cronópios

Quando os cronópios cantam suas canções preferidas, ficam de tal maneira entusiasmados que frequentemente se deixam atropelar por camiões e ciclistas, caem da janela e perdem o que tinham nos bolsos e até a conta dos dias.

Quando um cronópio canta, as esperanças e os famas acorrem a ouvi-lo embora não compreendam muito seu arrebatamento e em geral se mostrem um tanto escandalizados. No meio da roda o cronópio suspende seus bracinhos como se segurasse o sol, como se o céu fosse uma bandeja e o sol a cabeça do Batista, de forma que a canção do cronópio é Salomé nua dançando para os famas e as esperanças que ali estão boquiabertos e perguntando-se se o senhor padre, se as conveniências. Mas como no fundo São bons (os famas são bons e as esperanças bobas) acabam aplaudindo o cronópio, que se recupera sobressaltado, olha em redor e começa também a aplaudir, coitadinho. "

Julio Cortázar

03 novembro 2005

:: loser

a vida não me ganhou.
a vida me venceu.
:: visita

olá, faz tempo que não passo por aqui. vim-lhe dizer olá e perguntar como está. como você mesmo disse, somos pessoas muito práticas. juntamos um tanto de saudades e antes que se torne falta, resolvemos com uma visita, comentário no blog, um telefonema, um bilhete, um scrap de orkut, uma mensagem em software de janela escondida. uma ou outra vez, anotamos em algum papel os assuntos que gostaríamos de conversar se tivéssemos tempo para nos encontrar. é-me muito suspeito essa desigualdade demasiada entre os assuntos e o tempo uma vez que os assuntos também estão a merce do tempo. mas aí você me dirá que nossa vida é como a música: muitos sons sobrepostos que formam um fluxo que nos faz sentido muitas vezes. e que esses encontros são as pausas e silêncios que as músicas costumam ter.

sim, segui seu conselho e comprei roupas novas. o cabelo está crescendo a minha revelia, como muita coisa estou deixando. da última vez, você me sugeriu salada porque eu não estava cuidando muito bem de mim mesmo. veja só: descobri as feiras livres. e mesmo que eu não tenha muita prática, gosto de passear por lá. você deveria renunciar a esses supermercados. é uma sensação boa atravessar algo que não estará mais lá. é como uma pequena fenda na geografia de seu bairro. comprei morangos e espertos como são, os feirantes já me deram receitas de caldas para que eu pudesse voltar e comprar mais morangos. pensei: voltarei? sim porque mesmo que a tarde todos tenham indo embora, na semana que vem, eles voltam. assim como você não consegue deixar de ir na minha casa para roubar a agenda cultural das últimas sextas-feiras do mês.

mas confesso que senti saudades nesses últimos tempos. encontrou outro que pudesse roubar as informações do cinema? eu também tenho ido pouco. outro dia estava na frene de um, olhando os cartazes e imaginando a qual filme você assistiria. está tudo muito caro e carteirinha de estudante vence daqui a pouco. acabo guardando o pouco para a feira essa que é caminho da sua casa, pensando em comprar morangos e deixar na sua porta.

olha, também trouxe a agenda cultural. está encartada junto com o caderno do carro. peguei o segundo caderno e o de empregos.

bom, já vou indo. espero que me visite em breve. e se vier atravessando a feira livre, no inverno, não se iluda: não é época de morangos bons. prefira o cinema.
:: não sei solar

tempestade entre a unha e o dedo:
só assim se explica o nervoso do meu toque
na aparente simplicidade das minhas mãos pequenas.
:: tsuru.36

dedilhar a terra com os dedos dos pés.
fazendo cócegas e achar que é música.

02 novembro 2005

:: tsuru.35

é como um avião que plana num imenso céu: aos poucos vai descobrindo sua natureza.

01 novembro 2005

:: tsuru.34

quando fizer uso do seu escudo do antebraço, vou gostar de pensar que me chama com gesto.