a million parachutes

for us

27 fevereiro 2004

:: daniel

encontrei daniel numa fila de banco. estava tirando o restinho da poupança para se mudar para poa. da última vez que vi há alguns anos, ele tinha cabelos compridos e não usava óculos. lembro-me de alguém dando a última de que ele fugira da escola.

as notícias que correram era que ele assumira a lavanderia do pai e que por algum tempo prosperou. até que se casou por ter engravidado a namorada. ouvi falar sobre a falência da lavanderia em tempos de lavagem a seco. o difícil, ele me contava depois da fila, numa padoca, era gastar pouco para esquentar a água.

não conversei com daniel sobre fellini ou livros surpreendentes. de política só comentamos que o pt não era mais o mesmo. ele gostaria de ter falado sobre mulheres e como as conquistava, mas inibiu-se. acho que nunca tinha visto ele se inibir com esse assunto. falamos de futebol (palmeirense adorando a gaviões cair e a macha subir no carnaval) e de como estava difícil arranjar um emprego. que era muita sorte ter um diploma e que tinha esperanças de voltar a estudar. ajeitou os óculos, olhou para mim e disse:

-- japonês, se isso tiver vazio não tem jeito.

apontava para o coração. deu dois tapas sonoros em meu peito e disse o boa sorte mais sincero que já ouvi. e foi embora. pensei que podia ter dito que nos reencontraríamos ou mesmo trocar telefones. mas ao contrário de mim, daniel sabe das coisas.