a million parachutes

for us

21 julho 2003

:: pipas

aprendeu com um namorado a arte secreta da guerra das pipas. em seu bairro existiam regras rígidas: linha 10, 30 m de cortante e era proibido o uso de vidro de lâmpada fosforecente. todos diziam que dava câncer.

foram dias bons. ela aprendeu tudo que ele podia ensinar e num determinado momento, era até melhor. ela era mto respeitada e ele se orgulhava disso.

um dia, ele mudou de cidade e deixou com ela mais um segredo. era um carretel americano cheio de artíficios como carretel de pescador.

o tempo passou e as batalhas aéreas continuaram. ela chegou a empinar umas 2 vezes mas desistiu; não tinha graça sem ele.

os pipas caíam na sua casa e ela as guardava. os meninos não tinham coragem de pedir de volta porque era um honra que ela as empinasse. ela guardava todos num canto invisível do quarto... para ele.

acordou, um dia, com a luz forte do sol e um vento sereno. deixara a janela aberta e os papéis da escrivaninha voaram. as pipas, no chão. achou-os tristes por perderem o sentido. ela mesma percebeu que a cada dia perdia o sentido.

pegou alguns sacos de supermercado e fez uns 100 metros de rabiola. contou as pipas: eram 29. entre varetas de bambu e peixinhos. deu a todos a devida rabiola. pegou o carretel americano e a sua velha lata de nescau e foi para rua.

os meninos fizeram roda para vê-la empinar. ela deu o carretel americano para uma menina que fazia pouco das pipas. levantou vôo às 29, uma de cada vez, e mesmo que os meninos lhe oferecessem cerol para 3 quilometros de linha, ela foi se deixando cortar.