a million parachutes

for us

28 fevereiro 2005

:: cartas

tenho sobre a mesa duas cartas que não foram enviadas a seus destinatários. estão comigo porque seus remetentes não tiveram a coragem de enviar e acharam que talvez fizesse sentido para mim que sou curioso com essas coisas epistolares. leio com atenção, tento compreender seus detalhes, interpreto rabiscos e a falta de cuidado em certas partes.

envio todas as minhas cartas, só alguns esboços evito porque ainda os vejo como esboços.

são duas cartas de despedidas, mas não necessariamente que anseiam isso. a primeiro fala sobre a falta e a saudade; a segunda retoma a idéia de círculo em que compara a memória recente com a memória mais passada. vejo muita mágoas em ambas, sofrimentos e memória. vejo pouca invenção ou esperança real. a dor é a coisa mais real que vejo nessas linhas.

as minhas cartas já foram assim. já tiveram essa finalidade de aliviar a dor como analgésicos. talvez, ainda tenham um pouco essa finalidade. mas como me proponho sempre a enviá-las, sei que se comportarão como diálogos. a dificuldade é encontrar a linha tensa entre o que deseja falar/ouvir e como esse discurso refratará no meu destinatário. no caso das cartas em minha mesa, percebo que os destinátrios são mais os seus próprios remetentes. um jeito de projetar seus próprios desejos já que a realidade os repudia de forma tão convicta.

o que farei com ambas? pensei em me basear para escrever textos, transformá-las e dar uma dimensão diferente. algum tempo atrás talvez fosse a forma mais digna de saber suas existências.

mas só dessa vez, acho, que vou enviá-las: para os seus destinatários e para seus remetentes.