a million parachutes

for us

29 fevereiro 2004

:: painkiller

joana, querida, mude de canal. você não vai conseguir escrever as mazelas e inquietudes de sua alma tomando drogas e chupando drops. compre uma caneta confortável e folhas com linhas diáfanas. se dê a opção de seguir ou não as linhas. não adianta se machucar assim para representar fisicamente ou que a mente a exagera. raspe minha sobrancelha se isso a faz feliz. compartilho com a sua idéia de rock n roll: estamos velhos para o rock, mas não para o roll.

tenho que usar óculos sim, querida. já não vejo suas ancas e suas furias direito. não adianta passar a goma do terno de meu pai, não peço que use os vestidos de sua mãe. tudo bem, eu lhe dou a mão quando passearmos pelo centro se você parar de me apurrinhar em usar gravata. oh, querida jo, por que não abre um hiato em sua agenda e compramos pizza meia quatro queijos e meia frango com catupiry hoje? posso tentar pintar suas unhas de sobremesa. imprimi um monte de coisas do kandinsky.

se eu gosto do seu nariz? eu amo o seu cabelo! e esse sorriso eterno que me irrita 70% do tempo, mas que faz o restante ser o paraíso. tem dias que no trabalho, anotando, tendo reuniões, decifrando os labirintos internéticos, eu só quero me lembrar direito do seu sorriso. seu nariz vem junto. seu cabelo, e essa parte perto dos seios. do pé me lembro quando eu tropeço ao estar ainda desatento por estar pensando no seu sorriso.

não deixo de pensar no que fomos. mas é um pensamento de longe. normalmente minha cabeça está tão ocupada com nossa solidão e com os afazeres que evito mergulhar em piscina que não possa voltar. vou ver as meninas jogando volei. vou ver as meninas recitando suas poesias. vou vê-las dançando, cantando, fingindo prazer, serem feliz. mas é sempre você, joana querida, que me atormenta a palavra felicidade.

venderia você em pastilhas, se isso aliviasse o seu desejo dolorido de estar no mundo.

28 fevereiro 2004

:: where the blues of the night meets the gold of the day

a palma da minha mão, o lado esquerdo do teu rosto.
a ponta do meu polegar, as suas palpebras temerosas.
a minha ofegação, os labirintos do seu ouvido.
os meus cabelos curtos, os entre dedos de sua mão.
o meu ponto final, o seu parágrafo e travessão.
a minha memória inventada, a sua imaginação invertida.

a sua tristeza pela falta, a minha vontade de ser melhor.
o seu preparo da gravata, o meu nó em seu vestido.
as suas cantorias no chuveiro, o meu acompanhamento no violão.
a sua total vocação, a minha desrespeitosa pretensão.
os seus olhos, a minha boca, os seus céus, os meus chãos.

a velocidade das suas palavras, a lentidão dos meus gestos.
a sua noite azul amarelada, o meu dia dourado azulado.

27 fevereiro 2004

:: o fim do longo solo de sax

deixei minhas notas sobre a mesa. recuperei alguns arquivos, textos antigos, bilhetes e cartas até. não é um simples reunir, é o começo de um lugar.

o que sempre me amedrontou foi a solidão de se jogar a uma empresa tão infinita. vou juntar todos os cacos, refazer remendos, criar uma textura de pano novo. a solidão, sim. ficar tão só com essa massa disforme e lhe fazer companhia até seu sustento.

vou aceitar minha solidão e praticá-la em algum material. roteiro, romance, crônica, bilhete, carta... tenho que ter a coragem de aceitar que a felicidade prometida não é para mim. aceitar e seguir em frente.

vejo agora que só me resta isso. se em algum momento, a vida me enganar de novo, deixo estar. vou me acalmar e preparar este material. se quiser me amar, fique a vontade. quem sabe eu amo de volta? o coração que tenho é seu, enfim.
:: ok

pediram: "márcio, seja visceral!"
ok.
:: sawako

aquela lágrima que caiu do olho esquerdo de sawako foi uma das coisas mais legítimas que já vi, embora tenha sido provacada pela renúncia de outrem. há momentos em que justificamos as estações com choros e motivos para chorar. são tempos difíceis, tão difíceis quanto legitimar apenas uma lágrima. depois disso, ela tentou se matar e perdeu a memória com seu fracasso. ficou mais bela em sua própria insanidade, mas talvez, em outros tempos, só a lágrima bastasse.

:: daniel

encontrei daniel numa fila de banco. estava tirando o restinho da poupança para se mudar para poa. da última vez que vi há alguns anos, ele tinha cabelos compridos e não usava óculos. lembro-me de alguém dando a última de que ele fugira da escola.

as notícias que correram era que ele assumira a lavanderia do pai e que por algum tempo prosperou. até que se casou por ter engravidado a namorada. ouvi falar sobre a falência da lavanderia em tempos de lavagem a seco. o difícil, ele me contava depois da fila, numa padoca, era gastar pouco para esquentar a água.

não conversei com daniel sobre fellini ou livros surpreendentes. de política só comentamos que o pt não era mais o mesmo. ele gostaria de ter falado sobre mulheres e como as conquistava, mas inibiu-se. acho que nunca tinha visto ele se inibir com esse assunto. falamos de futebol (palmeirense adorando a gaviões cair e a macha subir no carnaval) e de como estava difícil arranjar um emprego. que era muita sorte ter um diploma e que tinha esperanças de voltar a estudar. ajeitou os óculos, olhou para mim e disse:

-- japonês, se isso tiver vazio não tem jeito.

apontava para o coração. deu dois tapas sonoros em meu peito e disse o boa sorte mais sincero que já ouvi. e foi embora. pensei que podia ter dito que nos reencontraríamos ou mesmo trocar telefones. mas ao contrário de mim, daniel sabe das coisas.

:: alberta

alberta nasceu numa noite fresca de outono. não esperavam que sobrevivesse a antecedência, mas seus pulmões diziam sim.

mas não eram só seus pulmões que supreenderam a todos. alberta nascera com um olho verde e outro azul. no dia de seu sétimo aniversário, sua mãe já prevendo a chacota da vizinhança, sussurrou em seu ouvido, num tom carinhoso e profético:

-- qdo vc se ver no espelho, lembre-se que se pode ver as coisas com olhos diferentes.

26 fevereiro 2004

:: notícias do front

já tenho os zines impressos comigo e amanhã a tarde vou postá-los no correio. deverão chegar na semana que vem. as pessoas que me mandaram o endereço, por favor, confirmem comigo a chegada dos zines. quem quiser receber, mande o seu endereço para marcioyonamine@yahoo.com.br .

na segunda-feira, dia 1 de março, às 10 horas da manhã, estarei defendendo o meu trabalho de conclusão de curso. quem quiser assistir pode comparecer nesse horário na eca/usp. perguntem pela secretária do ctr que lá informaram a sala em que será feita a defesa.

abs a todos

márcio, em um dia bom.



24 fevereiro 2004

:: big fish



fazia tempo que um filme não me tocava tanto. chorei do principio ao fim. talvez a febre tenha alterado um pouco minha percepção e criticidade, mas quer saber: foda-se.

na "invenção do cotidiano" de certeau há uma passagem em que é discutido como o mundo ordinário é narrativo e não descritivo científico. talvez essa seja a forma em que resistimos àlgumas perfidias da nossa ingaia ciência.

adoro ouvir histórias. quando digo "oi" muitas vezes quero dizer "o que fez hoje?". acredito que na falsidade da história há uma sinceridade muito mais interessante que a verdade em si. takvez seja a questão de enganar-se. tenho medo de estar errado, mas mesmo assim arrisco.

há uma cena em que o filho do contador de histórias diz que não conhece o pai porque este não sabe diferenciar o real do irreal. sempre tive a impressão de que havia mais a se descobrir nas histórias do que num questionário para tirar a carteira de identidade.

eu conversava isso com algumas pessoas e principalmente com a ana. não é porque você nunca viu que não possa existir. a casa invisível existe em histórias que contamos uns aos outros. e a cada história ela vai tendo mais vida, mais significados e menos medo.

não tenho medo de dizer que é uma dos melhores fiz que já vi na minha vida. não porque tem uma fotografia foda ou um roteiro interessante. mas porque assisti num momento em que precisava conversar e assim como todos os filmes da minha vida me disseram algo, big fish disse para mim: não há mal em inventar se você faz de coração. por isso retomo essa grande mentira que é esse blog.

e agora, tentando encontrar na minha memória, não conheço matéria-prima mais vital para se ter esperança do que histórias.

23 fevereiro 2004

:: give out but dont give up

às vezes, dá vontade de desistir. outras vezes, só quero um colo para dormir diferente. não importa se as camas são muitas. também não importa se sei falar de amor. vou tentar escrever algo que valha realmente a pena. um texto que não contenha palavras, mas significados. que não seja cabeça, mas coração. e que seja doce e bonito como cerejas carameladas.

pouca gente comenta por aqui, porque dizem que não há o que comentar. as pessoas tem vários motivos para escrever, o meu é contar histórias que ouvi. se não há comentários meus em outras caixas é porque me reservei um post inteiro para isso. "eu sou a soma de tudo que vejo", diz uma música perdida por aí.

cada dia que passa sinto que o parachutes tem mais sentido para mim que para qualquer outra pessoa e isso eu nunca quis. reluto em fechar porque tem muita gente que passa por aqui e me dá um alô. talvez eu não seja tão rock n roll como pensava. talvez não tenha lido drummond o suficiente. talvez é uma palavra difícil de significados.

acho que é isso. volto assim que puder.

22 fevereiro 2004



ana,

soube do acontecido com certo espanto. e a gente que sempre está a mobiliar as coisas invisíveis, vê os nossos objetos e sentimentos expostos e quiça deturbados. gosto quando fazem bom uso do sofá ou que preparem comida boa com as hortaliças do seu jardim delicado. não sei ainda o quanto de mau uso fizeram das nossas coisas, mas sei que o chá não tem o mesmo gosto.

nessas horas tenho medo do mundo. essas invasões barbáras nos fazem pensar em feudos, proteção e alguma segurança. tudo pelo que lutamos contra porque somos desses que anseiam uma liberdade justa. tenho medo, querida, de me diluir em tantas cópias e falsetes que não possa mais cantar o que originalmente está reservado para você em meu coração. é um perigo que racionalmente não comprovo, mas que me aterrorizou ao ver o nome das personagens serem trocadas quando em mim esses nomes signficavam tanto quanto nossa casa.

ainda recuso a instalar alarmes e cercas. os muros, só os que possam ser atravessados. essas pessoas não entraram em nossa casa porque eles não entenderam o que era a casa. para eles, os objetos continuaram inexistentes. mal sabem eles que a invenção requer uma verdade para consigo. dessas verdades corajosas que tomam convites para os ouvidos e pedras na cabeça. pagamos o preço da nossa falsidade porque preferimos as nossas a verdades dos outros.

nossa casa e jardim não é para nos proteger. sua imperfeição é um convite. podem fazer casas e jardins a partir dessa, mas serão apenas imagens perfeitas e inertes.

21 fevereiro 2004

:: little miss drama - video

um video para a marcela, menina de um sorriso muito doce que faz aniversário na semana que vêm.



é preciso ter o real player. é aconselhável ter banda larga.

:: good morning, heartache

bom dia, flor do dia. peguei pérolas na praia ontem e juntei com girassóis para fazer um colar impreciso que parte é do tempo presente e parte é para as coisas que chama de eternas. tive esse sonho de brigadeiro e ornamentos enquanto ouvia uma música. passo café e tento me lembrar que as notas e os versos. percebi que sei pilotar.

café bom.

flor do dia, o amor é "the very thougts of you" com a billie holiday, veja só.

20 fevereiro 2004

:: ana

se são poemas eu não sei dizer.
só sei que essa coisa no estômago não é azia;
e essa disritimia no coração não é dolor.

e que preciso respirar diferente.

:: happiness, more or less

um pouco de felicidade nesse coração de ferro e estanho. consegui resolver uma questão lá no meu trabalho e marquei a data de defesa do meu tcc (trabalho de conclusão de curso). um dia bom apesar de algumas notícias tristes (toma lá da cá). gostaria de agradecer a todos que fizeram uma rezinha para que essa pressão passasse logo, principalmente para aqueles que suportaram meus lamentos chatos e mau humorados.

para quem se interessar: http://www.bandalheira.hpg.com.br .

a defesa é no dia 1 de março, às 10 horas da matina, lá no ctr/eca/usp. a galera de são paulo está toda convidada. torçam para que eu vá bem.

19 fevereiro 2004

:: some pain

a cris me recomendou dramim. perguntei se o remédio existia porque era um nome muito bom para algum médico ter dado.

alguém canta: god bless silent pain and hapiness.

talvez essa dor passe se fechar os olhos assim.

mas dramim é para dormir bem.

18 fevereiro 2004

:: untitled #02

"o essencial é inivível aos olhos" saint-exupéry
:: bolinho de arroz

é tudo no olho...

mas é assim um ovo, umas tres xicaras de arroz cozido, sal a gosto, queijo parmezão, mostarda e orégano. mistura tudo, depois vai acrescentando farinha de trigo até dar liga. Se vc quiser fazer bolinho redondinho põe mais farinha pra ele ficar mais durinho...mas eu gosto de deixar ele meio molengo e ir jogando com a colher na fritura...fica crocante...

(receita da ana)
:: hoje

hoje estou apenas cansado do mundo. vou deixar as invenções de lado e apenas respirar. hoje não quero sonhar. só quero dormir um sono justo. quero tirar essas dores lentas e as preocupações, reinstalar meu centro e correr poucos riscos.
só por hoje.

17 fevereiro 2004



ana,

não tenho conseguido organizar meu tempo para que pudesse lhe escrever com boa ternura. fico apreensivo porque quero lhe passar um sensação tranqüilizadora e para isso espero por um momento tranquilo. percebi que não há como, por enquanto, esperar por um momento desses ou me forçar a ficar mais calmo. então resolvi escrever com o nervosismo do momento mesmo, peço que me perdoe a falta de traço e estilo e qualquer coisa que soe tempestade.

procurando por um arquivo (percebeu que é somente o que fazemos nessa vida?), encontrei outros tantos de muitas épocas diferentes. lendo, pude identificar quase todos os humores e estados de conservação. poderia jogar quase todos esses textos fora, é verdade, mas os guardo como cápsula do tempo. até os hiatos mantenho nos arquivos para me lembrar dos tempos mortos que semearam tempos vivos.

soube do adiamento de sua viagem. nessas horas sempre parece que a vida é uma adiamento apenas. tenho essa sensação às vezes, mas visto uma bermuda e saio para passear. tenho uma amiga que tem uma vida adiada. ela sai de blusinha e se dá um frescor. volta sorrindo da silva, mesmo que as coisas não aconteçam na rapidez que deseja. ela acredita em deus. e eu acredito, às vezes, nela.

e tem chovido muito nesta cidade. desliguei o som para poder ouvir porque sei que em outras estações isso vai ser bem mais raro.

estou lendo "as cidades invisíveis" do italo calvino e imaginando que você será marco polo contando histórias de reinos que não existem, mas que poderiam se as pessoas se importassem. e aprenderá cem línguas para relatar em metáforas a inexatidão da criatura humana. ainda brigando com as muitas anas?

relendo alguns textos antigos meus percebi que gostava muito de um discurso panfletário, daqueles que dizem na cara e explicitamente, embora com dificuldades, as coisas do coração. por algum motivo fui perdendo isso. não sei se é um tempo morto em que tenho que semear ou se já colho serenidade. mas não importa. só sei que a maioria das histórias escrevo pensando se vai gostar ou não. não sei se isso é bom. mas é um critério e um motivo para continuar.

marcio

p.s. numa próxima carta comento as músicas dos cds.
:: gaveta II

e nem me disse direito porque foste;
se tinhas mesmo que ir ou era um sonho seu
ou um desejo de falar outras línguas
e pensar de várias outras formas
mas com a mesma ternura implícita
e com as fábulas que sustentam seus coracóis.

e indo, me deixou algumas questões do tipo:
"para onde vou agora
que você mudou as coisas por aqui?"

e foste do modo mais formal
beijos, abraços, palavras sobre boa-ventura,
não me esqueça por muito tempo;
mande-me emails frequentes.
mas o que sobrou?

é tudo.
:: gavetas

um poema antigo. hoje faz outro sentido. estranho...

o exercício da solidão

eu organizei o armário da cozinha
enfileirando os temperos, tipos de açúcares
e condimentos estrangeiros de difícil pronúncia.

aluguei um smoking com a tal goma
e uma costura impecável.

refiz todos os cálculos sobre pagamentos
impostos, cartão de créditos, rendimentos de poupança
e sei que é possível saldá-los bem.

tenho tentando não esquecer seu nome do meio
e por isso escrevi na carteira.

fiz alguns marcadores de livros
com mensagens otimistas
para suas angustiantes leituras.

devolvi à capa respectiva
todos os seus CD`s trocados.

te compus um riff num violão meio desafinado.

troquei sem sua autorização a marca do café
e comprei açúcar em excesso.
e quando me pedir uma xícara,
posso preparar duas.

16 fevereiro 2004

:: big ben

e se o universo for apenas um susto?
um espirro?
seria tão ruim?
:: um dia

um dia vou ter pernas mais compridas para poder alçar vôos com asas brilhantes que também terei. vou ter uma boa conversa, muito agradável e cheia de artimanhas. as pessoas irão rir das minhas piadas e se comoverão com minhas histórias. vou ter um sorriso cativante e menos medo de dizer coisas que são importantes para serem ditas. vou usar roupas mais de acordo com o que penso e saberei mais sobre jazz e música erudita. vou ter lido menos clássicos e mais gente que está viva. vou compreender o porque de tanta falta e saberei acudir com destreza as pessoas que procuram.

vou retribuir em bom tom todas essas pessoas que me amam torto, quase sem sentido. vou escrever para eles, não precisarei fazer por mim. vou escrever roteiros lindos de histórias extraordinárias que terão base nas observações que fiz das coisas ao meu redor. vou falar dos sucessos e frustrações e de como se perde ou mantêm a esperança. vou comentar o quanto as pessoas que conheço acham que estarão melhores porque deixaram ressentimentos e mágoas para trás. eu mesmo terei menos medo.

um dia vou escrever versos menores e mais tensos. uma poesia concentrada e sábia. vou compor sambas e baladas pops que dirão a quem amo o quanto. vou ter de volta amigos que se afastaram e novos ainda mais diferentes de mim. vou conversar sobre futilidades sem ter a culpa de ser omisso. minha mão vai tremer menos e minha cabeça vai lembrar mais. vou me desfazer de todas as caixas e fazer novas. vou passar mais o tempo alegre que triste ou indiferente.

um dia, desses qualquer, vou sentar na areia da praia e chorar porque você me dirá de uma forma tão amável que esse dia chegará que eu terei que rever minha certeza do contrário.

15 fevereiro 2004

:: Both Sides Now - Joni Mitchell ::


Rows and flows of angel hair
And ice cream castles in the air
And feather canyons everywhere,
I've looked at clouds that way.

But now they only block the sun,
They rain and snow on everyone
So many things I would have done,
But clouds got in my way.

I've looked at clouds from both sides now
From up and down and still somehow
It's cloud's illusions I recall
I really don't know clouds at all

Moons and Junes and ferris wheels,
The dizzy dancing way that you feel
As every fairy tale comes real,
I've looked at love that way.

But now it's just another show,
You leave 'em laughing when you go
And if you care, don't let them know,
Don't give yourself away.

I've looked at love from both sides now
From give and take and still somehow
It's love's illusions I recall
I really don't know love at all

Tears and fears and feeling proud,
To say "I love you" right out loud
Dreams and schemes and circus crowds,
I've looked at life that way.

Oh but now old friends they're acting strange,
They shake their heads, they say I've changed
Well something's lost, but something's gained
In living every day.

I've looked at life from both sides now
From win and lose and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all

I've looked at life from both sides now
From up and down, and still somehow
It's life's illusions I recall
I really don't know life at all

p.s. thanks, van.

14 fevereiro 2004

:: o beagle da concessionária

aimar morava no pátio da concessionária biguaçu desde que sua mãe foi atropelada na rua em frente. era engraçada e esperta, os vendedores a consideram um atrativo. sempre houve quem quisesse levá-la, mas ela fugia e voltava. os donos tentaram lhe dar o nome de bigua, mas ela não respondia. era aimar e um latido.

ela dormia perto de um xr3 conversível. diziam que ela gostava de ver as estrelas. inconscientemente, ninguém conseguia vender o carro em consideração a aimar. qualquer impecilho era uma grande pedra. até que um turco ofereceu um preço alto e não teve como não vender. desde esse dia não viram mais aimar.

ela deve estar na turquia, correndo no seu xr3, com suas orelhas ao vento, latindo esquisito para a prenuncia esquisita que fazem do seu nome.
:: quase história

reecontraram-se no aeroporto. talvez três anos, parecia menos. quase não se reconheceram. ela cortou os cabelos e a nova maquiagem deixava os olhos menos fundos. ele começou a usar gravata e óculos. pegaram o mesmo avião para o rio de janeiro. ela escrevia para uma revista teen. ele tratava da contabilidade de um astro da globo. sabiam que tinham assuntos pendentes.

conversaram sobre coisas supericiais.

ela agradeceu a companhia. ele ia dar o seu número, mas desistiu. ela percebeu. seguiram seus caminhos.

há mais nessa história, mas coloquei aqui somente os acontecimentos comuns que ouvi de ambos.

penso em como a mágoa e o ressentimento podem nos manter plácidos e lúcidos. mas também como podem tirar parte de histórias que gostaríamos de contar.

:: clara

o que se passa na cabeça da mulher que espera? sentada na mesa do canto, estrategicamente contida mas podendo ver a janela e todo o estabelecimento. segura um café em copo de isopor para que não perdesse o calor. para que não perdesse o calor.

o casaco mostarda, os ombros para dentro. só os olhos estão a vista e eles são só para quem ela espera. orvalho falso sobre as bordas do copo. marcas úmidas sobre a mesa. o garçom vem limpar, ela impede. quer que deixe como está. que a deixa em paz. já deve estar atrasado porque no salão o som dos ponteiros são mais altos do que os passos dos fregueses. os lábios tensos nos causam comoção. ela tenta sorrir, mas não tem para quem. mas não tem para quem.

do lado de fora da janela as pessoas chegam. as pessoas vão. o tempo é ameno, mas espera-se chuva. ela torce para que não tenha, não trouxe guarda-chuva. mas trouxe esse casaco para o frio. ele chega. o esperado atravessa a porta, senta-se na cadeira reservada. pede desculpas pelo atraso, estranha o nervosismo dela. ela permanece quieta, muito dentro de si. e só quando consegue vê-lo com mais calma, sorri. ele pergunta se esperou muito, ela responde que não muito, o tempo de passar um expresso. o tempo de organizar em sua cabeça os juros de sua ousadia ao comprar aquele casaco mostarda em prestações. os juros, a ousadia e as prestações.

13 fevereiro 2004

:: não há tanto porquê

acho que penso de um modo antigo e tomo ares de melancolia naturalmente aos olhos outros. não aspiro liberdade ou relações perigosas. sou, como diz musil, um homem sem qualidades. vivo uma vida até bem ordinária: compro pão, lavo roupas, não gosto de passar, mas passo, fico algumas horas na internet e sou curioso por livros e filmes. às vezes vem parar em minha mão um assunto delicadíssimo qualquer com o qual encaro como desafio ou como desalento. sonho com outras vidas que podia ter tido. mas sonho mais com essa que estou tendo. evito muito as afirmações com medo de estar errado. pergunto mais do que sei responder. não gosto de testes de q.i. e acabei me viciando em café.

já pensei em deixar os domingos para arrumar os erros de português, mas é o horário dos melhores seriados de tevê.

não tenho talento algum para qualquer coisa mais arrebatadora. vejo graça nas coisas contidas e ordinárias. me divirto colecionando conselhos e bilhetinhos escritos a mão. me acho bastante solitário, mas não o suficiente para me fazer mal ou para aborrecer as pessoas. aborreço pouco, vou aprendendo.

do mais, acho que essas histórias que eu conto são muito mais interessantes do que parecem. vai ver que eu me emociono deveras com elas porque eu as testemunhei de alguma forma. contar assim não tem tanta a força, mas é um registro. invejo alguns autores que fui conhecendo, queria ter o frescor das palavras. mas me conformo porque pode ser um trabalho útil esse de catador de acontecimentos.

e como disse, me contento com muito pouco e me divirto pacas.

12 fevereiro 2004

:: termas

vou ali. quem sabe eu volto... beijo grande a todos.

11 fevereiro 2004

:: parachutes.tv episódio 4

truman. cerejas carameladas. retrato de navio. punch drunk love. é preciso ter o real player .


:: uma janela

na minha frente, cortiça com cartões postais. do meu lado esquerdo, uma janela. do meu lado direito, uma estante de livros. nas minhas costas, somente cansaço e um pouco de resignação. há portas escondidas por aí. deixo para tocar um cd que me foi dado com esperança de que todas as janelas e portas continuem abertas. os cartões postais pedem para que sonhe. a janela chama para a vida lá fora. os livros fechados fazem desdém mas pedem. nas minhas costas só quero alívio.

no teto do quarto colo uma foto sua e fico olhando até que caia e eu desapareça.
:: cartas

eu reli todas as suas cartas antigas
e entendi muita coisa diferente.
pensava que suas letras redondas e laçantes,
sua falta de cuidado em terminar as linhas
e desenhos de esferográficos
eram só brincadeiras para passar menos tempo no papel
e deixar as cartas menos ralas que telegramas.
pensei ter lido telegramas, sempre.

e sempre me foi aborrecido saber sobre seus laços
ou seu sonho de ter entrado no mackenzie.
creme para as mãos, meias com desenhos da hello kitty,
programas da mtv e chocolates com menos calorias.
reli todas as suas cartas antigas e percebi que não falava de calorias.

envelopes impecáveis, a letra mais cuidado no envelope
para que os correios não se engassem porque você não se enganava,
você tinha planos e arquiteturas. você nem precisava mandar cartas,
mas mandava assim mesmo. para acabar aquela coleção de papéis de carta
que deixavam você com cara de menina e não de mulher.

e eu perdi o hábito de responder. e você foi perdendo a vontade de mandar.
e perdeu a vontade de escrever também.
e perdeu a vontade de que não enganessem o meu endereço.
e eu perdi seu endereço novo.
e você esqueceu de me ligar para dizer o seu endereço novo.
e eu então reli as suas cartas antigas
e entendi muita coisa diferente.

entendi que era para eu ter o cuidado em responder tanto quanto
você tinha de escrever. mas não era para ser descarado,
porque ambos éramos pessoas difíceis. e agora mais velhos, ainda mais.
entendi que era para que eu guardasse seu endereço novo
porque se precisasse, podia mandar eu uma carta ao invés de uma resposta,
porque você também queria responder cartas, com o mesmo cuidado
das pessoas que lhe enviaram. mas que eu não seria o único,
mas o mais esperado, porque eu sabia de seus laços,
de seu creme e de suas meias, dos seus videoclips
e da sua vontade de ser um pouco mais bonita

para mim.

[2002]

10 fevereiro 2004

:: os sonhos são os mesmos

jennifer era a mais tímida. thelma comia xambinho com dedo e billy achava que billy não era nome de homem. as três eram putas que viviam num apartamento em cima da loja de móveis usados, lá na avenida celso garcia. concordaram em morar em tal moquifo para economizar dinheiro para que pudessem tomar seus caminhos certos assim que pudessem. era um compromisso de separação.

os meninos da febem sonhavam com o varal de calcinhas pendurado do lado de fora da janela.

jennifer engravidou. thelma perdeu boa parte de seu dinheiro no bingo e billy se feriu ao fugir de um tarado e ficou coxa. o tempo as fez família mas não perderam a esperança de se separarem.

thelma é monitora num telecentro, billy traduz manuais americanos e jennifer deu a seu filho o nome de billy.

o varal do lado de fora da janela seca outros panos, mas os sonhos são os mesmos.


:: anja

que fazes que andas não cansada? aborrecida. os dias te aborrecem com suas pedrinhas. e ainda nem podes dar sua ruflada da semana. compromissos, contas e tentativa de pegar a promoção do supermercado. no quarto branco, os gatos sentem saudade, mas és muito atenciosa para que sintam falta.

espreguiça-te com força e afugenta um pouco o sono. faz tua bondade com cara de malícia de hoje e dorme (sonha) porque amanhã é outro dia que tentam te tomar as asas. é outra dia para pregares peças a quem tenta.
:: a língua dos bichos de pelucia

na última edição da scientific studies foi publicado um artigo de professores do departamento de linguistica da universidade de brinkey que abre novas perspectivas para o estudo dos significantes no mundo das representações.

basicamente os teóricos defendem a idéia de uma linguagem que vai se perdendo em invenção a medida que avanços nos anos. chamaram esta linguagem perdida de a língua dos bichos de pelúcia.

segundo natália brincamar, uma das professores do grupo "cute" como tem sido chamado, a invenção está dando lugar a uma gramatica cada vez mais autoritária a ponto de as palavras serem mais importantes que as pessoas. "é um absurdo respeitar alguém que tenha vocábulos e não culhões!", disse brincamar.

a idéia de bichos de pelúcia veio quando brincamar observou sua filha paula conversando anemidade com pipon, o coelho de pelúcia ganho no natal passado. "ela conversava com ele numa língua que para muitos seria absurda, cheias de palavras inventadas e verbos em tempos inexistentes". a primeira reação da pesquisadora foi um certo nervosismo com a idéia de que sua filha estivesse esquisofrênica. foi quando percebeu que de tanta incompreensão fluia um entendimento simples que partia do sorriso de paula.

os críticos mais referrenhos da teoria da escola de "cute" não tem poupados críticas. as mais assíduoas a chamam de infantil. o grupo se defende mostrando o dedo do meio.

[agência reutar]
:: caderno de anotações para as tempestades

difícil ter um quando o que você quer é só ter um guarda-chuva com o mínimo de eficiência.

09 fevereiro 2004

:: parachutes.mail.zine.02

o número 2. quem quiser assinar é só mandar um email para:

marcioyonamine@yahoo.com.br

ou para:

amillionparachutes-subscribe@yahoogroups.com

ou colocar o email naquela caixinha a esquerda.

obrigado aos assinantes... =)

:: wonderland

#1

através dos vidros dos coletivos,
uma sensação de que alguém está contando a nossa história.
billie holiday cantando bem baixinho os pretensos amores expressos
que cultivamos em nossos corações para estarmos certos do preparo quando, algum dia, o momento chegar.
fico chorando pelos cantos, fico rindo à toa,
decoro as melhores letras que saem da boca de ella fitzgerald,
aprendo a dança como Gene Kelly e sei que tenho meu lugar nas bem ditas big bands.
tudo,
tudo a espera da próxima parada,
quando os cinemas estarão abertos para receber seus amantes,
os bares terão as cervejas mais geladas,
e eu terei dinheiro para te comprar algumas flores que podem durar mais se colocadas num copo de água com aspirina.

enquanto isso, abro o livro e procuro por um ensinamento.
mas entre um romance de thomas mann e um dicionário
o que me detém em não abrir ambos? melhor tivesse comigo,
os livros de virginia woolf ou jane austen...
já abandonei os livros de versos por tanta falta de rima
em meu coração.
eu poderia ler kafka para chegar em wonderland,
as seria muito injusto com lewis carrol.
então abro o dicionário:

parada.sf.1.ato ou efeito de parar.2.local onde alguém ou algo pára.3.pausa, interrupção. 4. formatura ou desfile de tropas. 5.quantia em que se aposta no jogo em cada lance.

então adormeço, apostando que você me acorde quando chegar.

#2

pois que Wonderland fica longe, longe...
nos estados unidos. quem espera encontrar
entre luzes de néon e algumas ribaltas
as cores temáticas da felicidade,
verá apenas os tons pastéis, âmbar, de quem se corrigiu
a tempo de aparecer bonito na fotografia.

os postes, as ruas, as calçadas, os pedestres...
quem canta tanto o objeto inerte? não responda
que Wonderland já disse em inglês... o destino subjulgado.

wonderland, próxima parada.

#3

há alguns estive em wonderland a negócios
e no principio não achei nada de excepcional.
um americano que falava um português vagabundo,
a solidão, a solidão... e alguns amigos.
por que não restituir a mediocridade o lirismo de outrora?
wonderland passa em meus olhos e meu nariz lateja
e acho que estou dizendo a verdade.
:: circunstância

só assim, considerei que meu duplo era você,
que estavas tão perto que não pude enxergar.
e despropositalmente, pisei-te, beijaste minha sola,
senti cócegas e me apaixonei.
:: poderia ser prosa

compor um quadro do formato da janela,
giz de cera e aquarela. o formato da gota,
a estrutura da gota, um fio de água.
o que será que ela está pensando?
certamente, deve se ocupar com algo,
a tempestade só lhe aborreceria.

hidrocor. livros abertos em páginas alheias
a qualquer tipo de amostragem ou tendência.
terminar o site... devo contar a ela?
digo que lhe devo uma vida menos aborrecida?
a pequena guerra sonora no telhado,
alguns acordes no violão,
interferência nas ondas de transmissão
empobrecem a imagem da minha tv...
ela estará assistindo ao mesmo programa?
segunda-feira, domingo... trovões, relâmpagos.
verões inteiros para se pensar nela,
e ela nem sabe, ou finge que não sabe.

bacias para suspender as gotas que caem dos telhados,
chamo de desejo as vestes que ela usava
quando nos encontramos pela última vez.
quedo pela fraqueza mais compacta:
o de ter medo de levar choque em dias de tempestades.

xadrez. videogame. filmes e “o mundo anda tão complicado”.
mastigo o aborrecido pensamento de ter uma vida simples,
uma rotina de falta de empreendimentos e certeza do dia seguinte.
o dia seguinte é a falta de tempestades.
uma lâmpada queimou... devo acender velas?
certamente, o cheiro de parafina deixará mais atrativas
estas palavras que considero apenas uma diversão.

lista de compras. aniversariantes do mês. ela faz aniversário este mês.
o jeito é esperar que a chuva pare para comprar presentes.

07 fevereiro 2004

:: impresso

este mês sai o primeiro número do zine parachutes impresso. quem quiser receber em casa é só mandar o endereço completo para marcioyonamine@yahoo.com.br . o zine terá uma tiragem de 50 exemplares.

06 fevereiro 2004

:: hemorragia

acordo. olho pela janela e há um dia para se apaziguar a alma. unf... quero dormir mais algumas horas, mas decido por alguns minutos. viro-me na cama e vejo algumas manchas de sangue sobre o travesseiro. havia tido uma hemorragia nasal que se curou naturalmente, não saberia se não fossem as manchas.

penso na possibilidade de estarmos feridos e não saber e me assusto. penso em algumas pessoas que estariam preocupadas em apenas lavar a capa do travesseiro. penso em outras que chamam de tristeza as suas feridas.

ergo a cabeça de maneira a garantir que o sangue não me saia. e acabo adormecendo novamente.
:: beta

já no adiantado da hora, ela prepara sua refeição e seu banho. sobre a cama arrumada, roupas que por hoje serão perfeitas. organiza entre suas notas os recados sobre um ou outro verso que lhe chamou a atenção (muitas notas de um mundo que é todo atenção). o café cheira o calor do bem fazer. o pão agradece o queijo fresco. da janela vêm a luz que revela a coisa refeita. não é hora ainda de lembrar do condicionador para as roupa ainda no tanque.

o que fazes, beta, nos braços da amiga madrugada?

me preparo para dormir.

:: varal

pendurei um grande pano branco no varal que os vizinhos chamaram de lençol. nele eu comecei a escrever sobre suas habilidades e anseios. desenhei seu sorriso e a forma de sua perna. pintei a cor que você desejou seus cabelos e costurei alguns retalhos que poderiam representar suas lembranças. essas manchas vieram com o vento e a canseira da cidade grande.

de manhã, toco uma música feliz e você parece amarela. de noite, uma coisa mais triste e você azula.

deixo uma cadeira muito próxima. fico sentado esperando que seu tecido me acarecie. ou que lhe dê forma a palavra ou o vento. ou que se liberte e fuja. ou que só me encubra numa noite fria. o que vier primeiro.

05 fevereiro 2004

:: fantasias e devaneios

"O mundo inteiro teme a própria vida. A morte é coisa que não é nossa. Mas a vida, a vida é, e eu morro de medo de respirar.”

Clarice Lispector

03 fevereiro 2004

:: i love you as you love me

amo seu sorriso. esse sorriso que de tão grande força os olhos a se fecharem. as sobrancelhas dizem satisfação. a franja esconde com cautela a testa preocupada. sente-se sozinha no mundo, mas sorri. os meninos fingem, as meninas fingem. fingem dor em sorrisos felizes.

amo seu comprometimento com laços de amizade. o seu tratado com pessoas tratantes. os desenhos do corpo se movem na confluência dos movimentos da alma. a alma navega, o leme é teu sorriso. leva neles os anos dos amigos, esconde nele a angustia de outros amores, fala deles com competência só dedilhando sorrisos.

amo as suas poses. o cabelo novo. deitar no travesseiro a doença e a fraqueza. como se ama em detalhes o que se pensava amar em cosmos.

02 fevereiro 2004



ana,

a vida ordinária não tem sido boa conosco. vamos conjugando o verbo como pede a cartilha; temos a segurança dos investimentos da poupança e previdência e de quando em quando ouvimos os pássaros em seu elegante vôo ao nosso desconhecido.

mas essa falta de uma vida menos ordinária me inibe um pouco quando penso em lhe escrever. se faço agora é com a licença da naus dos ousados embora pareça só bebedeira. confesso a estupida dificuldade que é lhe escrever um texto que toque seu espirito livre, de fronteiras e geografias plausíveis como a alma. vai querer ir para alguma lua, sei bem.

o dueto das flores que me mandou continua fresco em meus ouvidos e já preparo com cuidado e delicadeza uma coletânea para lhe enviar junto com o livro da clarice e outros agrados. assim vou fazendo das horas minucias cheias de significados e corações refeitos. assim vou trilhando o meu caminho para te encontrar em alguma lua por aí.

01 fevereiro 2004

:: izis

izis é uma dessas mulheres inesquecíveis, mas que não esquecemos por outras razões.

ela tem uma melancolia natural de gente apressada mas que não pode com a própria pressa. sabe todos os macetes sobre a solidão, mas quando pensa que a subverte, é ela, a solidão, que lhe prega peças.

possui segredos como todos. bebe desejando o limite como todos. anseia por um espírito livre que supõe morar nas capitais. o som de cinema é mais baixo do que deveria, mesmo os silêncios gritam diferente para izis.

ela escreve cartas, mas envia poucas. e mesmo sendo brasília uma cidade em que tudo está longe, nem os correios são próximos de seu coração.

izis é uma dessas mulheres inesquecíveis. pensamos nela e em sua tristeza de 1000 faces e nos reconhecemos um pouco e ficamos com vontade de dizer a ela que não está só, falar um oi amável. e essa sensação nos toma durante todo o dia. e é mais difícil esquecer assim.
:: parachutes.mail.zine.01

primeira edição do mail.zine semanal. para assinar, coloque seu email na caixinha que tem no lado esquerdo, perto da webcam. não consegui colocar todo mundo que pudesse estar interessado pq o yahoogroups só aceita 10 add por dia. versão online aqui.

talvez consiga uma versão em papel...
:: #01

é uma noite qualquer. meus fantasmas falam comigo e finjo não ouvi-los. uma ou outra pessoa me adverte sobre a depressão e a solidão. há remédios e sitcoms. a gente vai sendo rejeitado e se convencendo que não. mostram-nos outros pontos de vista que embora não estejam errados, estão muito longe de estarem certos. vamos falando de poesia porque sempre nos soa redentora. talvez a palavra nos abstraia o suficiente para que não sofremos mais. sofrimento é aquela coisa que te deixa triste e te impede, ou isso é a solidão?

na noite silenciosa, somos apenas solitários e bêbados brincando de fado.